sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

S.O.S Saúde

Na semana passada, meu avô sofreu um acidente de trânsito que resultou em uma perna quebrada e vários arranhões. Até hoje ele se encontra no hospital (IJF). Já foi colocado um pino externo em sua perna, mas ainda restam duas cirurgias: Uma para tirar o pino e outra para enxertar o calcanhar. Depois disso, evidentemente, ele terá que fazer fisioterapia. Mas a preocupação por enquanto é com as próximas cirurgias. No último domingo fui visitá-lo. Muitas pessoas na fila para visitação. Fui acompanhado de meu pai e meu irmão. Só poderia entrar duas pessoas na sala de recuperação. Como eramos três, tive que ficar esperando. Quando meu irmão saiu do quarto, chegou minha vez. Vi meu avô, deitado em uma cama com um colchão quase que afundando. Perguntei se estava tudo bem, se o pino incomodava e tal. Havia mais cinco pessoas ali dentro. Dois "elementos", um senhor com o braço amputado, outro com fraldas e uma faixa na coxa (provavelmente deve ter fraturado o fêmur) e outro rapaz que também estava com pino externo na perna esquerda. Só de me lembrar dá uma sensação de gastura. O quarto estava fétido. Era um cheiro nada agradável. Parecia uma mistura de sangue, fezes, urina e remédio. De repente, comecei a ficar tonto. Apoiei-me nos ombros de minha avó e disse que estava ficando um pouco zonzo. Saí do quarto, sentei-me do lado de fora e esperei a tontura passar. Foi o odor.

Dava pena em entrar naquela sala (se é que pode dizer) de recuperação. E imaginar que eu também passei pela mesma situação de meu avô. Era 20 de junho de 2008, sexta-feira. Minha aula havia acabado mais cedo. E fiquei em um banco, no corredor do colégio, conversando com meus amigos. Quando um deles chega com a mão cheia de balas. Dava-se início a um "bambolim". Enquanto nos divertíamos, surge outras pessoas que não tem nada a ver com a história e participam também. O bombom é jogado. Eu pulo para tentar pegar. A bala escorrega da minha mão. Quando vou pegá-lo no piso, me empurram e caio. Assim que abro os olhos, me levanto imediatamente. Passo a língua entre os dentes e consto que havia um quebrado. E quando olho para baixo, vejo meu braço direito deslocado. Começa a maratona do sofrimento. Seguro meu punho direito e vou para a sala da direção. A coordenadora me levou para o mesmo hospital (IJF) em seu carro. Meu pai imediatamente foi para lá. Me encontrou em uma cadeira de rodas, sofrendo com muita dor, com fome e sede. Não havia uma cirurgia lá para o meu caso. Foi feito um pedido de transferência. E na fila, um garoto de Aquiraz que havia quebrado em três partes seu antebraço. E desde o dia anterior ele esperava a transferência. Eu e meu pai tememos que acontecesse o mesmo. Mas por sorte, minha transferência foi feita na mesma hora do garoto. Graças a Deus.

Fui para o outro hospital na esperança de que fosse feita o mais rápido possível a minha cirurgia. Mas fomos informados de que não eram realizados tais procedimentos no final de semana. Fui para a sala de recuperação daquele hospital. Eram eu e mais cinco pessoas. Mais uma vez, por sorte, minha mãe conhecia uma das diretoras, que entrou em contato com ela. Fui transferido daquele quarto para outro, somente com uma pessoa, com ar-condicionado, frigobar, televisão, ventilador. Eu estava no "setor particular". Sábado e domingo se passaram. Sendo que domingo a noite fui informado de que minha cirurgia seria na segunda pela manhã. Ainda bem (ou não). Comecei o jejum naquela noite. Na manhã seguinte, o doutor passa em minha sala as 08:00 dizendo que estava esperando o anestesista e que logo seria minha vez. Deu 09:00, 10:00, 11:00, 12:00, quando as 16:00, já morrendo de fome e de sede, fui para a sala de cirurgia. Só me lembro que colocaram uma agulha em minha veia no braço esquerdo, olhei para um relógio e dormi. Eram 16:10. Acordei com a vista completamente embaçada. Ouvia vozes. E uma pessoa me empurrando pela maca. Pensei: Graças a Deus acabou. Foi colocado uma platina e seis parafusos. Estou até hoje com essa platina no braço. Não desejo fazer outra cirurgia tão cedo. Mas ainda tinha que enfrentar outra etapa. Suportar mais duas horas sem comer. Chamava por meu pai o tempo todo, queria comer algo. Ele dizia que não era a hora. Que eu tivesse que aguentar até chegar o momento. Chorei, mas resisti. Quando deu 21:30, abri os olhos e meu pai me deu a janta. Era uma coxinha de frango, que já estava fria, e água mineral. Garanto que foi uma das melhores refeições que já comi na vida. Já eram quase 24 horas sem comer. Senti na pele o que uma pessoa passa quando está com fome. No outro dia, recebi alta. Quinze dias depois, retirei os pontos. Comecei a fisioterapia logo depois. Sofri na primeira semana. Doía muito. Afinal, não movimentava meu braço direito havia mais de um mês. Havia muita senhoras, que vinham me consolar. Diziam que eu me recuperaria, que elas também passaram por isso e tal. Na semana seguinte, não sentia mais dor. Comecei a mexer o braço, mas não o punho. A doutora ficou preocupada. E lá fui eu enfrentar mais uma batalha. Quando por volta do mês de Novembro, consegui levantar minha mão. Foi uma felicidade. Permaneci na fisioterapia até Janeiro desse ano.

De certa forma, pude participar do dia-a-dia daquela profissional que me ajudou na recuperação de meu braço. Não irei revelar o nome mas agradeço de todo o coração. Como dito, diariamente convivi naquela instituição. Não era particular. Sobrevivia de doações e de recursos do SUS. Mas se tratando do SUS, não se pode esperar um serviço de qualidade. Não estou querendo dizer que meu tratamento foi em vão. Talvez seria, se não fosse pela dedicação e competência de minha fisioterapeuta. Havia dias que ela reclamava de aparelhos que não funcionavam e que precisavam de manutenção. Mas nunca consertavam. A sala de fisioterapia era no andar superior. O sol batia bem nessa sala. O calor era mais outra reclamação. Nem os ventiladores davam conta. E reclamava, também, de seu pagamento. Não sei como está a situação agora, mas durante esse tempo em que estive na fisioterapia, era "o negócio era meio complicado. E do que falar do IJF então. O maior hospital de urgência do estado. Recebe pacientes de todos os lugares. Interiorenses é o que não falta. A situação lá é triste. Parabéns para aqueles que trabalham ali dentro e agem se não havesse nada de estranho ali. Claro, já como trabalham lá, é rotina. Mas se alguém, que não entrou naquele hospital, conhecer a realidade, talvez teria vontade de chorar. Recentemente houve uma greve por lá. Prejudicou vários e vários pacientes ali dentro. Esse governo incompetente que não destina recursos para a saúde não merece nosso respeito. A cada dia que passa, mais cidadões morrem nos corredores. É preciso que reverta esse quadro. A saúde no Brasil (e aqui também) está agonizando.

Nenhum comentário:

Postar um comentário